A crise habitacional é uma realidade em nosso contexto urbano, sendo alvo de discussões na maioria das grandes cidades do mundo. Enquanto o preço dos aluguéis parece cada vez mais alto, o número de pessoas sem condições de moradia digna também permanece preocupante.
Em busca de amenizar essa crise e contribuir com a queda dos custos de habitação, o governador do estado americano de Colorado, Jared Polis, tem falado sobre um plano de adensamento dos bairros que ele acredita ser um grande passo para a resolução desse problema.
A ideia é elaborar um projeto de rei que eliminaria algumas restrições locais em relação ao uso da terra, permitindo que sejam construídos mais sobrados e edifícios residenciais em áreas que atualmente só permitem construções de residências unifamiliares.
A cidade de Denver, capital do Colorado, foi desenvolvida no século 20 com incentivos a construção de residências unifamiliares, criando um zoneamento bem restrito que permite apenas um determinado uso dentro de sua região delimitada. Tal incentivo partiu até mesmo do governo federal, que após a segunda guerra investiu ainda mais na construção de rodovias e bairros cada vez mais afastados e planificados.
Ainda nos anos 1970 esse modelo de cidade passou a ser questionado nos EUA, um estudo patrocinado pelo governo em 1974 chamado de “The Cost of Sprawl” (“O Custo da Expansão”) mostrou que os serviços públicos de infraestrutura tornavam esse modelo de bairros de subúrbio como a forma de desenvolvimento residencial mais cara, especialmente em comparação com a ideia de cidades mais densas e compactas.
Mesmo com o alerta, a cidade de Denver pareceu ter ignorado esse recado, chegando a ter cerca de 80% de sua área destinada apenas para residências unifamiliares, de acordo com pesquisa de 2021 liderada por Carrie Makarewicz, do departamento de planejamento urbano e regional da Universidade do Colorado.
O rápido crescimento populacional do Colorado encontrou obstáculo nas restrições de construções de residências. A consequência natural foi o aumento no preço dos aluguéis, somados com questões econômicas nacionais como a inflação e a taxa de juros.
Mas o projeto de lei realmente vai contribuir para a diminuição do preço dos alugueis?
O novo projeto de lei se baseia na ideia de permitir moradias multifamiliares, incluindo sobrados e prédios de até seis unidades e gerando bairros com maior densidade.
Grupos defensores dos bairros e entidades como a Liga Municipal do Colorado são contra a medida e dizem que a ideia de os preços caírem não se fundamenta, ainda que pesquisas digam o contrário. Em 2018, o Furman Center da Universidade de Nova York, argumentou em um estudo que uma parte considerável de pesquisas sobre o tema indica que leis menos restritivas do uso do solo costumam estarem associadas com preços mais baixos. Uma pesquisa da Universidade da Califórnia de 2021, por exemplo, encontrou fortes indícios de que a construção de novos apartamentos com preços de mercado contribuiu para o não aumento no preço do aluguel em moradias próximas já existentes.
Outro argumento é a respeito da cidade de Houston, onde existem menos restrições e os alugueis são mais baratos comparados com outras cidades do país
Dentre outros pontos presentes nesse projeto de lei, está a ideia de “zoneamento inclusivo”, que exige a construção de algumas unidades com preços mais acessíveis em prédios residenciais multifamiliares maiores. Outra proposta é a da redução dos requisitos mínimos para estacionamento, tema alvo de outros posts aqui no blog, como aqui e aqui.
É preciso estarmos atentos para alguns discursos anti regulamentações, especialmente aqueles que surgem dos defensores das grandes construtoras, porém não podemos ignorar os malefícios de algumas leis que na prática só contribuem para a desigualdade social e para o mau funcionamento das cidades. O caso de Denver merece ser acompanhado com atenção.